sexta-feira, 18 de abril de 2008

IGREJAS INFECTADAS

Igrejas infectadas
Ricardo Gondim.


Aos 25 anos de idade, depois de várias febres, muita rouquidão e um péssimo hálito, dei o braço a torcer e aceitei que o médico operasse as minhas amídalas. Resisti o quanto pude porque sabia que as amídalas existem para proteger as vias respiratórias.

Contudo, o médico conseguiu me convencer de que as minhas estavam imprestáveis; tão infectadas que já não protegiam, mas contaminavam o resto do organismo. Só restava uma opção, arrancá-las fora. A partir daquele dia, aprendi que um órgão – qualquer um – pode perder a sua função original e passar a atacar o corpo.

Nas relações humanas e sociais acontece o mesmo. Quando se perdem as finalidades originais, morrem casamentos, empresas, igrejas. Serve o exemplo da família: pai e mãe devem oferecer um ambiente em que os filhos aprendam a ter confiança, segurança, dignidade. Mas quando acontecem muitas brigas com ódio, quando falta paz, aquela família perde a função de fomentar auto-estima e segurança. Assim, deixa de ajudar e passa a desajustar as crianças.

As religiões também podem virar amídalas infectadas. Bastar ver na história. Inúmeras igrejas criaram ambientes doentios e desumanizadores, quando deviam ser espaços de humanização.

Devido a este site, recebo milhares de mensagens sobre assuntos variados, a grande maioria, entretanto, pede ajuda. Muitos não suportam os sermões vazios com promessas mirabolantes e ameaças de maldição. Entristeço, mas fica óbvio para mim que as lógicas e práticas da igreja evangélica não consegue responder às complexidades do século XXI. Os espaços evangélicos estão febris.

É preciso detectar, rapidamente, onde a infecção se tornou aguda para combatê-la com doses maciças de antibióticos espirituais e éticos; com um bom diagnóstico não será preciso operar o foco da contaminação e ainda preservar o organismo.

Estão infectadas as igrejas que priorizam programas e não relacionamentos. Jesus não tratou a “igreja” como uma instituição, mas como uma comunidade. Igreja são mulheres e homens com um estilo de vida nobre, verdadeiro, que inspiram os outros a glorificar a Deus. Portanto, para o seu eterno propósito dar certo, Jesus não precisa de eventos sofisticados, basta que seus seguidores amem uns aos outros.

Estão infectadas as igrejas que priorizam poder e não serviço. Nas Escrituras, poder só tem sentido quando mobiliza para solidariedade, compaixão, humildade. A busca do poder pelo poder é luciferiana em sua essência. Jesus criou o mundo, mas se esvaziou, encarnou e morreu numa cruz. Os cristãos não almejam tronos, mas bacia e toalha para lavar os pés alheios. Sem esperar aplausos, sentem-se privilegiados de servirem.

Estão infectadas as igrejas que priorizam espetáculo e não discrição. Jesus ensinou que não se devem cobiçar os primeiros lugares; considerou que a autêntica piedade acontece num quarto de portas fechadas; falou que a mão esquerda não deve conhecer o que a direita oferece. Quando Jesus ressuscitou uma menina, respeitou a privacidade da família e não deixou que estranhos entrassem para testemunhar o milagre. Sobram exemplos de seu recato. Certamente, Jesus não se agrada de saber que alguns tentam transformar a fé num show.

Estão infectadas as igrejas que priorizam milagre e não coragem existencial. Paulo considerou tudo como esterco pela excelência do conhecimento de Cristo – esse, somente esse, deve ser o alvo da espiritualidade cristã. Não se cultua a Deus para descobrir um jeito certo de “alcançar milagre” ou para ter uma fé mais “eficiente”. No culto, celebra-se o amor gratuito e unilateral de Deus. O Evangelho é boa notícia porque todos são aceitos sem exigências. Deus quer bem sem fazer distinção; não se ganha o favor de Deus com obras. Graça é o chão onde todos podem alicerçar a vida com liberdade e sem culpa. O cristão não precisa que Deus conserte as dificuldades da vida, basta a sua companhia.

O Apocalipse foi taxativo com uma igreja infectada: “Lembre-se de onde caiu! Arrependa-se... Se não se arrepender, virei a você e tirarei o seu candelabro do lugar dele. Os evangélicos precisaram, como nunca, ouvir esta exortação.

Soli Deo Gloria.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

COMO O IR DA ALEGRIA!

Cri, por isso falei; também nós cremos, por isso também falamos,
Caminhamos na direção daquilo que cremos, ainda que
este crer não seja tão palatável, mas é assim que as coisas se processam.
Com isso definimos prioridades ou não.
Alegrias ou não.
Tristezas ou não.
Vamos seguindo meio que dominados pelo Crer em
nós embutidos!!!
E o pensar completamente cativo neste Crer!!!
Em que cremos desde a mais tenra infância?
Em que cremos nestes dias?
Como se deu o teu Crer?
Como está o teu pensar?
Um verdadeiro Crer nos dá VIDA e VIDA em abundância!

André Soares

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Precisamos amar a Deus não pelo que Ele nos dá, mas pelo que Ele é

Pregação do pastor Ricardo Gondim, no segundo dia do Encontro Nacional de Pastores e Pastoras Metodistas.




O espírito do Senhor Jeová está sobre mim: porque o Senhor me ungiu para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos. A apregoar o ano aceitável do Senhor e o dia da vingança do nosso Deus; a consolar todos os tristes; a ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê ornamento por cinza, óleo de gozo por tristeza, vestido de louvor por espírito angustiado; a fim de que se chamem árvores de justiça, plantação do Senhor, para que ele seja glorificado. Isaías 61.1-3

Esse texto de Isaías foi a base da conferência do pastor Ricardo Gondim no segundo dia do Encontro. Ele lembrou que, nos primórdios do século 20, o protagonista da filosofia niilista Nietzsche gritou "Deus está morto e nós o matamos". Contudo, entramos no século 21 ouvindo anônimos que gritam: “morreram os sonhos, morreu o Estado como promotor da justiça, morreu a arte, a família, o ecossistema...”

Começamos o século 20 com o que comumente se chama de modernidade. Entramos no século 21 com uma coisa esquisita que chamamos de pós-modernidade. Os estudiosos sequer têm um consenso sobre o que é isso. Alguns dizem que a modernidade terminou com o muro de Berlim. Mas outros dizem que a pós-modernidade é a agudização da modernidade.

O pastor destacou que modernidade não é um período da história, mas uma mentalidade, que se inaugura a partir de alguns eventos: grandes navegações, Renascimento, Iluminismo, ciência de Copérnico e Galileu, Reforma Protestante, Imprensa... "A modernidade é um jeito de pensar, de organizar a vida, um período em que a religião perde o seu domínio na cosmovisão". Nesses tempos pós-modernos, não é mais a religião que dita as normas da vida. A razão, o método, a experiência laboratorial é a medida que afere a verdade. Deixamos de lado a visão teocêntrica, predomina a antropocêntrica, o homem e a mulher estão no centro das atenções.

A modernidade se fortalece na Revolução Francesa, na Revolução Industrial, no positivismo otimista que crê no progresso, que acredita que as possibilidades do ser humano são infinitas; no marxismo que promete um paraíso na terra, no capitalismo que promete a acessibilidade dos bens de consumo. Essas são as grandes avenidas da modernidade. Só que o paraíso não se concretizou na terra e a modernidade começou a perder fôlego. "Se a modernidade produziu um Einstein, também produziu um Mengele. Se valorizou gente como Gandhi, Martin Luther King e Mandela, também trouxe Mussolini e Pinochet. Se teve Pavarotti, teve a morte trágica de Janis Joplin, a arte devassa de Madona e a caricaturização do ser humano na figura de Michael Jackson. Se teve Madre Teresa de Calcutá, Henry Nowen e Oscar Romeiro, também teve um Jim Jones e Reverendo Moon", disse Gondim.

Segundo o pastor, estamos na situação do goleiro que não sabe pra que lado ir quando a bola desvia no zagueiro. Estamos no contrapé. "A gente está no meio do ar sem saber. Não é mais tempo de Jean Paul Sartre, mas de Paulo Coelho. Não é tempo de Guevara, mas de Putin. Não se fala em Mandela, mas em Bush".

Se a atitude era otimista na modernidade, na pós ela é no mínimo cínica. Acreditava-se que o Estado laico seria o árbitro das injustiças sociais. Na pós-modernidade, o Estado precisa ser enxugado, pois é visto como lento e corrompível. Ocorreram guerras mundiais, o rio Tietê se poluiu, aconteceu o acidente em Tchernobyl, abriu-se um buraco na camada de ozônio. O que fazer? Essa é a angústia do homem pós-moderno.

Deus não morre como apregoa o filósofo, mas ressurge com força na explosão pentecostal, nos fundamentalismos judaicos, cristãos e muçulmanos. lembrou o pastor. Assim, a pós-modernidade impõe desafios à Igreja. O primeiro deles é a "ideologia do mercado". "Vivemos debaixo de uma lei que não é divina, que regula todas as nossas instituições sociais e comportamento". Cria-se nova espécie de evolução tecnológica. Afirma-se que só sobreviverão os que tiverem uma conjuntura tecnológica. Não há espaço para o pequeno no mundo neo-liberal.

Hoje é o mundo do mais forte, e esse mundo já está na Igreja. O mercado domina as necessidades eclesiásticas. Aluguéis são caros, é necessário recursos para fazer missões e está se exigindo dos nossos cultos tecnologia de ponta. "Tente ter uma igreja com pastor que não seja carismático", disse Gondim, ressaltando que usava esse termo no sentido de pessoa multifacetada, performática. "Na esquina há um pastor ávido por ter um rebanho. O mercado exerce pressão sobre o pastor, exigindo dele mensagens cada vez mais palatáveis. O mundo religioso ocidental vive uma época de grande crise de conteúdo. A maior parte do que se ouve no púlpito não passa de clichês e há um empobrecimento das letras das músicas".

Segundo Gondim, as igrejas evangélicas estão se distanciando do protestantismo quando tiram o eixo da pregação do Evangelho e colocam a ênfase na bênção. Essa é uma mensagem antropocêntrica. "Apregoa-se que Deus tem uma bênção para sua vida. Isso é um desvio crasso da nossa herança protestante. O cerne do Evangelho é a busca da justiça, não é bênção. A ênfase é proclamar a justiça de Deus. Isaías 61 diz `para que sejam carvalhos de justiça`. Quantas vezes o pastor não inicia o culto perguntando Quem vem aqui em busca de bênção? Eu mesmo já iniciei culto com essa pergunta. O que você espera de uma pergunta dessas?"

Gondim nos alertou que os pastores e pastoras são chamados(as) a ser carvalhos de justiça. Contudo, as igrejas estão se transformando em centros de neurolinguística com verniz evangélico. "A Bíblia diz: Buscai em primeiro lugar o seu Reino e a sua Justiça. Por que aquele que quiser salvar a sua vida perde-la-á. A vocês foi dado o privilégio de sofrer por Cristo. Pastor não é executivo, não é marqueteiro, nem mercadejador de esperança. É sacerdote do Deus Vivo, pregoeiro da Justiça!"

Segundo o pregador, os pastores e pastoras precisam entender a pressão que estão sofrendo do mercado. "Sofremos pressão do fundamentalismo, do legalismo e dos processos de recrudescimento dogmático". E explica que, diante das incertezas, diante da vulnerabilidade, há a perigosa tendência de se resvalar para um pragmatismo que desconsidera os valores espirituais e éticos, para um utilitarismo que utiliza o raciocínio do sucesso como padrão -- 'se minha Igreja está lotada, se cresce, está dando certo', diz essa perigosa forma de pensar. "Cemitério também cresce", alertou Gondim.

Como exemplo, ele contou a história de um colega pastor, no interior de São Paulo, que pregava em sua igreja a "batalha espiritual". Ele afirmava ter o poder de "degolar demônios". A igreja lotou. Amigos tentaram demovê-lo da idéia. Mas o fato é que sua pregação lotava a igreja... Segundo Gondim, a pergunta de pastores e pastoras deve ser: "isso gera a glória de Deus ou gera uma comunidade infantilizada, que transfere para as camadas espirituais o que é de nossa responsabilidade? "

Esse é um momento crítico e desafiador. A proposta do fundamentalismo escatológico, do evangelho integral, do pacto de Lausanne foi atropelado pelo neo-pentecostalismo. Os próprios pentecostais estão aturdidos pela teologia da prosperidade. Como resolver essa crise existencial, espiritual em meio a auditórios lotados?

Muitas igrejas buscam a resposta na oração. Mas o problema é como estamos orando, alertou o pastor. Muitas das orações que fazemos são barganhas ou ordens dadas a Deus. Existe uma resposta legalista: não deixar o mundo entrar. Essas igrejas se fecham "ao mundo", criticam o jovem que ouve uma música secular, restringem a vida ao ambiente eclesiástico. Existe uma resposta dogmática: precisamos de uma nova Reforma! "Mas qual delas? A de Lutero? Calvino? Voltamos ao puritanismo inglês? Estamos em outra época. É como querer ter cabelo de volta...", disse ele. "Existe ainda uma resposta pragmática, de influência americana: a Igreja com Propósito, o G-12, colocar power-point no culto, reformar o banheiro, melhorar o estacionamento, colocar mais figurinha na revista de Escola Dominical. Estamos embarcando nisso!"

Somos chamados não para elaborar exaustivamente uma resposta para o tempo em que vivemos, mas para alertar que esse paradigma não responde mais. Precisamos quebrar o paradigma do Deus intervencionista nos ambientes religiosos, do milagre de Deus restrito aos membros da igreja, disse ele, lembrando que a Graça de Deus é para todas as pessoas. Ele listou vários locais que carecem de vida, de cuidados, de amor: Gabão, Angola, favelas do Rio de Janeiro... "Por que os evangelistas não vão para a fila do ambulatório curar os doentes de dengue? A dor do mundo nos açoita. Não posso prometer celular novo a um membro da igreja diante dessa situação. Não posso dizer: Deus vai abrir uma porta de emprego em sua vida. Como posso dizer que Deus vai abrir uma porta de emprego ao crente? Deus colocaria o currículo do crente acima dos demais? Isso não seria pistolão? Detestamos quando um político faz isso e vamos pedir esse privilégio a Deus?É com política econômica, educação e justiça social que se abrem portas de emprego".

Gondim lembrou que as igrejas cristãs não estão num concurso de crescimento: "Você foi chamado para ser fiel, não para dar certo. Temos que devolver a Deus o centro da nossa pregação. Religião não existe para te fazer bem. O que está em jogo não é nossa felicidade, nosso bem estar, mas como nós entendemos a glória de Deus. Prega-se que Deus está a serviço do ser humano. Os pregadores perguntam O que Deus pode fazer por você. Esse é um desvio da mentalidade cristã do primeiro século".

As pessoas passam a amar a Deus por aquilo que ele dá, não pelo que Ele é. Esse é o problema de se pregar antropocentricamente.

Segundo Ricardo Gondim os pregadores de hoje têm dificuldades em pregar o evangelho para pessoas que sentem que a religião não faz sentido na vida delas. Há pessoas que sentem não "precisar de Jesus", enquanto outras buscam a Igreja apenas para satisfação de suas necessidades pessoais. Contudo, o papel da Igreja não é pregar satisfação às pessoas, mas anunciar o nome Santo do Senhor Jesus, o seu Reino e a sua Justiça. "Não importa se você precisa ou não. Eu vim anunciar um Deus maravilhoso, que é Jesus de Nazaré"

"Precisamos voltar a conhecer Deus não por aquilo que ele nos dá, mas pelo que Ele é". Lembrando do texto de Jó, ele disse que os sofrimentos impostos a Jó tinham uma razão clara: insultar a Deus. O insulto de Satanás foi: tu compras o amor de Jó, ele não te serve de graça".

Ao finalizar a sua palestra, Ricardo Gondim convidou todas as pessoas a se perguntar: "Qual é base do nosso amor a Deus?". O amor de Jó não estava baseado no que Deus lhe dava. No capítulo 19, em meio ao seu sofrimento, ele faz uma das mais belas proclamações de fé da Bíblia: "Contudo, eu sei que meu Redentor vive."